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12 de março de 2021

NOVAS QUESTÕES RELATIVAS ÀS SUBVENÇÕES

A Receita Federal do Brasil, recentemente, manifestou entendimento que reascende o debate acerca da tributação das subvenções. Para fins da discussão ora analisada, subvenções são assistências governamentais a entes privados, normalmente sob a forma de benefícios fiscais.

A conceituação de subvenções como sendo de custeio ou de investimento vem, há anos, gerando dúvidas e conflitos entre contribuintes e o Fisco federal, já que as subvenções para custeio são tributáveis pelo IRPJ, CSLL, PIS e Cofins, ao passo que as subvenções para investimento não o são.

Assim, a questão levantada pela RFB nesse recente posicionamento poderia ser resumida na forma da seguinte indagação: teriam todos os benefícios fiscais de ICMS natureza de subvenção para investimento – independentemente de qualquer intenção do ente subvencionador de fomentar investimentos – ou a intenção mencionada é necessária para haver a caracterização da subvenção de investimento?

Para contextualizar a discussão, vale rememorar que, desde 1978, a Receita Federal exarou o entendimento constante do Parecer Normativo nº 112/1978, segundo o qual as subvenções para investimento seriam aquelas em que houvesse: (i) a intenção do ente subvencionador de fomentar empreendimento econômico; e (ii) a específica e efetiva aplicação dos recursos recebidos pelo particular.

Nesse segundo requisito, na visão da Receita Federal, estaria contida a necessidade de o benefício fiscal ser diretamente condicionado à aplicação em empreendimento, bem como a necessidade de que essa aplicação fosse perfeitamente sincronizada com o auferimento da subvenção.

Esse entendimento levou à autuação de um grande número de contribuintes, sob a alegação de que, nos casos analisados, não haveria a referida vinculação nem a perfeita sincronia e, assim, na visão da Receita Federal, não estariam presentes os requisitos necessários à caracterização de uma subvenção para investimento, e os valores estariam sujeitos à tributação.

A discussão chegou ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) que, em boa parte dos casos, vinha afastando o requisito da sincronia, especialmente considerando que parcela dos benefícios fiscais era concedida por meio de créditos presumidos de ICMS, sendo impossível precisar o momento do auferimento do benefício.

Ainda que o CARF viesse formando um entendimento sólido no sentido de que a exigência de sincronia seria descabida, o entendimento da RFB se manteve intacto ao longo desses anos, de forma que o que havia sido consignado no Parecer Normativo de 1978 foi constantemente repetido nos textos das Instruções Normativas que posteriormente trataram do tema, estimulando a continuidade das autuações de contribuintes.

Esse foi o cenário que prevaleceu por muitos anos, até a edição da Lei Complementar nº 160/2017, que representou uma mudança de rumo do entendimento da Receita Federal. A Lei Complementar alterou dispositivos da legislação em vigor que versam sobre o tratamento fiscal das subvenções. Foi inserido o § 4º ao art. 30 da Lei nº 12.973/2014, prevendo que os benefícios fiscais de ICMS seriam considerados subvenção para investimento, “vedada a exigência de outros requisitos ou condições não previstas nesse artigo”.

Além de já afastar de plano os critérios da vinculação e sincronia, visto que não previstos no referido art. 30, a leitura do dispositivo legal em questão abriria duas correntes de interpretação possíveis. A primeira delas seria a de que todos os benefícios fiscais de ICMS seriam subvenção para investimento. A segunda corrente seria a de que os benefícios fiscais de ICMS com intenção do ente subvencionador de fomentar empreendimento econômico seriam subvenção para investimento. Portanto, a distinção entre as duas correntes estaria na necessidade ou não de haver a intenção do ente subvencionador (no caso, os Estados) de fomentar um empreendimento econômico de particular.

Diante desse cenário, a Receita Federal exarou duas soluções de consulta, de números 11/2020 e 15/2020. Segundo o entendimento constante desses atos, todos os benefícios fiscais de ICMS seriam subvenção para investimento, independentemente de qualquer intenção, filiando-se, portanto, à primeira corrente mencionada acima. No caso, foram analisados benefícios fiscais concedidos pelos Estados do Ceará e de São Paulo, em que não havia qualquer exigência de investimento.

No entanto, em dezembro de 2020, a Receita Federal publicou a Solução de Consulta nº 145/2020, entendendo que os benefícios, a fim de serem qualificados como subvenção para investimento, deveriam ser concedidos como estímulo à implantação ou expansão de empreendimento econômico. Esse ato, portanto, representou uma mudança no entendimento da Receita Federal, que passou a se filiar à segunda corrente de entendimento mencionada anteriormente.

A questão é relevante porque há inúmeros benefícios fiscais de ICMS concedidos pelos Estados que não possuem qualquer intenção de fomentar a implantação ou expansão de empreendimento econômico. Pela primeira corrente de interpretação, tais subvenções seriam de investimento e, portanto, não tributáveis pelo IRPJ, CSLL, PIS e Cofins. Pela segunda corrente, esses mesmos benefícios fiscais seriam tributáveis.

E, além da questão da qualificação das subvenções como sendo de investimento ou de custeio, que agora ganhou novos contornos nos casos de benefícios de ICMS, ainda há a decisão do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que os benefícios fiscais concedidos por Estados e municípios não poderiam ser tributados pela União. Isso afastaria a tributação sobre quaisquer subvenções, sejam de custeio ou de investimento.

Neste momento, portanto, os contribuintes têm de aguardar as definições sobre os benefícios fiscais de ICMS serem subvenções para investimento, a depender da interpretação dada à Lei Complementar nº 160/2017, bem como sobre a posição do STJ, de que tais benefícios não poderiam ser tributados independentemente de sua qualificação para fins fiscais.